O Supremo Tribunal Federal reconheceu, nesta quinta-feira (18/12), a existência do racismo estrutural no país. Por unanimidade, os ministros concordaram que há violação sistemática dos direitos fundamentais da população negra no Brasil e determinaram que haja a adoção de providências para superar o quadro.
“Esse reconhecimento da suprema corte brasileira reitera a importância do trabalho que temos realizado e nos provoca, como Governo do Brasil, a buscar formas de intensificá-lo ainda mais”, avaliou a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco.
Durante o julgamento da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 973 – APDF pelas Vidas Negras –, cujos votos começaram a ser apresentados em novembro, houve reiteradas declarações evidenciando a exclusão e a desigualdade que marcaram a trajetória do povo negro no país.
O relator da ADPF, ministro Luiz Fux, votou pelo reconhecimento existência do racismo estrutural em novembro. No último dia de julgamento, ele ajustou seu entendimento, considerando que há um conjunto de medidas já adotadas ou em andamento para sanar as omissões históricas, o que afasta o estado de coisas inconstitucional inicialmente citado em seu voto.
Se somaram a ele os ministros Cristiano Zanin, André Mendonça, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar Mendes, que também consideram a existência de graves violações e defendem a necessidade de adoção de providências contundentes.
Já os ministros Flávio Dino, Edson Fachin e a ministra Cármen Lúcia admitem que há uma omissão estatal sistêmica no enfrentamento das violações de direitos da população negra e reconhecem o estado de coisas inconstitucional decorrente do racismo estrutural e institucional, seguindo o voto inicial do relator.
Não digam que sou da vida rebotalho, nem que fiquei à margem da vida. Digam que procurei trabalho, que sempre fui preterida”, declamou a ministra Cármen Lúcia, citando a escritora negra Maria Carolina de Jesus em seu voto.
Ela trouxe, ainda, versos do cantor negro Emicida, ilustrando a violência contra os negros, e destacou que a Constituição Federal completou 37 anos sem que o Brasil tenha sido capaz de construir uma igualdade racial efetiva.
“Não é possível continuar preterindo mais da metade da população brasileira por puro, grave, trágico racismo”, acrescentou a ministra do STF.
Medidas concretas
Dentre as providências determinadas ao poder público, estão a revisão ou a elaboração de um novo plano de combate ao racismo estrutural, além da revisão de procedimentos de acesso, por meio de cotas, às oportunidades de educação e emprego em função de raça e cor.
“Esse ano, as articulações do Governo do Brasil junto ao legislativo, por meio do Ministério da Igualdade Racial, nos levaram uma grande vitória no campo das ações afirmativas, que são a maior política reparatória do Brasil. Não iremos permitir retrocessos e consideramos que essa determinação fortalece nosso trabalho”, declarou a ministra Anielle Franco.
Outras determinações do STF são que os órgãos do Poder Judiciário, dos Ministérios Públicos, das Defensorias Públicas e das polícias devem criar protocolos de atuação e atendimento de pessoas negras, para melhor acolhimento institucional e enfrentamento de disparidades raciais.
“O Ministério da Igualdade Racial já realiza, desde o começo da gestão, iniciativas conjuntas com parceiros para qualificar o acolhimento institucional, como o curso de letramento racial e os da nossa ouvidoria para acolhimento e enfrentamento ao racismo e essa é uma nova oportunidade para avançarmos ainda mais na prestação do serviço público, modificando a realidade e o imaginário sobre a população negra”, lembrou a ministra.
Ação – A ADPF 973 foi ajuizada por PT, Psol, PSB, PCdoB, Rede Sustentabilidade, PDT e PV. Os partidos apontam que ações e omissões do Estado vêm negando sistematicamente os direitos constitucionais à vida, à saúde, à segurança e à alimentação digna da população negra. Sustentam ainda que essa parcela da sociedade está submetida a um processo de genocídio permanente, com destaque para a alta e crescente letalidade decorrente da violência policial e o hiperencarceramento de jovens pretos e pardos pela política antidrogas.
Os partidos defendem que esse cenário exige o reconhecimento de um “estado de coisas inconstitucional” e pedem a adoção de políticas de reparação, a partir de um plano nacional de enfrentamento ao racismo estrutural. Pedem ainda a definição de obrigações a serem cumpridas pelos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
Com informações do Supremo Tribunal Federal